domingo, 2 de junho de 2013

Cinema independente americano

William Blake (Johnny Deep) flutua para a morte na versão de Jim Jarmusch
para a vida em uma cidadezinha da fronteira no século XIX, em "Dead Man"

Embora o cinema independente americano tenha vivido um de seus grandes momentos nos anos 1980 e 1990, ele não foi, de forma alguma, um fenômeno restrito a esse período. O autêntico cinema independente - produzido fora dos grandes estúdios - não é novo nos Estados Unidos. Pequenos estúdios e cineastas vêm realizando suas produções desde os primeiros dias do cinema. Em vez de defini-lo simplesmente por critérios de produção e distribuição, o cinema indie é, pelo menos teoricamente, aquele com ideias próprias, resistentes às normas empregadas no grande circuito e vagamente ligado à contracultura. Os filmes independentes dos EUA são encarados como criações de cineastas com pontos de vista peculiares, que geralmente produzem e retêm os direitos sobre sua obra. Essa tradição inclui nomes tão variados quanto os de Andy Warhol (1929-1989), Robert Altman (1925-2006), John Cassavetes (1929-1987) e George A. Romero (n.1940)

O cartaz original de "Felicidade", de
Todd Solondz, sugere a infelicidade
dos personagens grotescos do filme
Os filmes independentes dos EUA floresceram com um cultura visível nos anos 1980. Figuras fundamentais foram o versátil John Sayles (n.1950), fazendo dramas contra o autoritarismo como "Matewan - A luta final" (1987), e Jim Jarmusch (n.1953), cujo estilo lacônico e descolado tem origens na cena nova-iorquina do orçamento zero do fim dos anos 1970. Joel (n.1954) e Ethan Coen (n.1957) deixaram sua primeira marca em 1984, com a comédia de humor negro "Gosto de sangue". Uma grande virada aconteceu em 1986, quando Spike Lee (n.1957) emergiu com a comédia "Ela quer tudo". A inventividade estilística, a provovação política e o empreendedorismo abriram caminho para uma nova leva de diretores afro-americanos, como John Singleton (n.1968), Matty Rich (n.1971) e os gêmeos Albert e Allen Hughes (n.1972) bem como para vozes mais experimentais como Julie Dash (n.1952)

Muitos desses pioneiros mantém longas carreiras de notável diversidade. Sayles ainda faz filmes elogiados pela crítica, como o faroeste pouco convencional "Lone Star - A estrela solitária" (1996) e a investigação sobre adoção "A casa dos bebês" (2003). Jarmusch continua a romper barreiras com filmes como o faroeste "Dead Man" (1995) e a série de vinhetas a respeito de celebridades "Sobre café e cigarros" (2003). Lee continuou a examinar os relacionamentos em "Febre da selva" (1991) e explorou o documentário "When the Levees Broke: a Requiem in Four Acts" (2006). Os irmãos Coen encontraram a fama fora do círculo dos cinéfilos com "Barton Fink" (1991) e "Fargo" (1996). Os Coen vêm trabalhando desde então em uma variedade de contextos comerciais, mas a singularidade de sua visão, consistente e às vezes perversa, os qualifica como modelos de independência. David Lynch (n.1946) desenvolveu sua carreira de forma semelhante à dos irmãos Coen, começando com um marginal por excelência com a anomalia assustadora de "Eraserhead" (1976).

Em 'Buffalo '66", Vincente Gallo estrela, ao lado de Christina Ricci,
como um homem vingativo que precisa de uma boa mulher

Iniciado em 1982, o Festival Sundance de Cinema - como é chamado desde 1991 - pôs o selo sobre uma cultura de cinema independente que prosperava em parte como uma reação ao conservadorismo predominante na gestão do presidente Ronald Reagan. O Sundance deslanchou a carreira de diversos cineastas, entre eles Steven Soderbergh (n.1963), que ganhou o prêmio do público do Sundance por "Sexo, mentiras e videotape" (1989). O filme chamou atenção para o novo cinema de baixo orçamento ao ganhar uma indicação ao Oscar e a Palma de Ouro no Festival de Cannes. Desde então, como diretor e produtor, Soderbergh experimentou diversos tipos de gêneros com diversos tipos de orçamentos possíveis, dentro e fora do grande circuito. Robert Rodríguez (n.1968) se destacou no Sundance com o filme de ação "El mariachi" (1992), concebido originalmente para o mercado de vídeo doméstico de baixo custo, em espanhol. Depois de seu sucesso, Rodríguez abriu seu próprio miniestúdio. Kevin Smith (n.1970) apareceu em Sundance com o ruidoso "O balconista" (1994), filmado na loja de conveniências onde ele trabalhava. Amador entusiasmado que fez sucesso, Smith permanece como o típico representante da cena indie.


O chamativo cartaz de "Os excêntricos Tenenbaums",
de Wes Anderson, indica a peculiaridade da família em questão

Outra vertente importante foi o chamado "New Queer Cinema" (Novo cinema homossexual). Fenômeno internacional, nos Estados Unidos os pioneiros incluíram Todd Haynes (n.1961) com "Veneno" (1991) e Gus van Sant (n.1952) com "Mala noche" (1986). Os dois diretores transcenderam esse rótulo com filmes formalmente inovadores. Da mesma forma, as mulheres encontraram mais espaço para criar uma obra singular no setor independente, entre elas Allison Anders (n.1954), com seu estudo de uma gangue hispânica em Los Angeles, "Mi vida loca" (1993), e Maggie Greenwald (n.1995), com o faroeste revisionista "Uma balada para Jo" (1993).

"O balconista" foi filmado em preto e branco
e montado à noite na loja onde Kevin Smith trabalhava

O cinema independente forneceu um abrigo para os cineastas experimentais, como Todd Solondz (n.1959), com provocantes sátiras sociais como "Felicidde" (1998); Larry Clark (n.1943), com seus retratos de adolescentes das cidades, como o corajoso "Kids" (1995); Paul Thomas Anderson (n.1970), com obras elegantes com grandes elencos, como "Prazer sem limites" (1997); e Wes Anderson (n.1969), com obras inteligentes como "Os excêntricos Tenembaums" (2001). Vincente Gallo (n.1961) fez sua estreia na direção com o filme sobre um ex-presidiário falsamente acusado, "Buffalo '66" (1998), que lhe conquistou um séquito de admiradores pela releitura do gênero, pela trilha sonora excêntrica e pela fotografia inovadora. A comédia "Slacker" (1991), de Richard Linklater (n.1960), incorporou uma estética indie e também definiu uma subcultura. Sua carreira subsequente incluiria tanto filmes comerciais quanto obras experimentais como o desenho animado "Waking Life" (2001). Sofia Coppola (n.1971), filha de Francis Ford Coppola (n.1939), demonstrou que o cinema estava em suas veias com o brilhante longa de estreia, "As virgens suicidas" (1999), e ganhou o Oscar de Melhor Roteiro Original com "Encontros e desencontros" (2003). Depois do drama de costumes experimental, "Maria Antonieta"(2006), ela retorna alguns temas no esparso "Um lugar qualquer" (2010). Porém, o rei dos geeks no cinema continua a ser Quentin Tarantino (n.1963), cujas energias cinéfilas e obsessivas - inicialmente descarregadas no conto inventivo e econômico sobre um roubo de joias, "Cães de aluguel" (1992) - o levaram a ser saudado como menino prodígio do cinema recheado com referências à cultura pop. Ele permanece como o principal ponto de referência para os fãs da produção indie.

O cartaz do documentário de Michael Moore sobre
o massacre de Columbine trasmite a mensagem
do filme contra o uso de armas de fogo

Os filmes independentes também tiveram impacto sobre os documentários, principalmente por conta de ensaios investigativos de Michael Moore (n.1954), como "Roger e eu" (1989) e "Tiros em Columbine" (2002). O impacto da obra de Moore deu impulso a uma nova leva de documentários extremamente diversificados, do tradicional realismo social de "Basquete blues" (1994), de Steve James (n.1954), à narrativa mais peculiar de "Na captura dos Friedmans (2003), dirigido por Andrew Jarecki (n.1963).

O mundo indie tem sido fértil para os fãs dos gêneros cinematográficos. O maior sucesso é "A bruxa de Blair" (1999), filmado em vídeo, um falso documentário que prenunciava uma nova onda de filmes de terror com baixo orçamento. O dinheiro, obviamente, influi. Obras de gêneros podem sofrer com restrições financeiras. Dramas prosperam mesmo com uma escassez de recursos quase teatral, ao passo que o terror e a ficção científica são mais difíceis de se produzir quando existe um nível de expectativa alimentado por anos de efeitos especiais. De qualquer maneira, distante do reluzir dos orçamentos amplos, novas ideias expressas com inventividade podem produzir ficção científica que funciona sob qualquer parâmetro. "Gattaca" (1997), "Donnie Darko" (2001) e "O homem duplo" (2006) são produções independentes que lembran a ficção intimistra de "Alphaville" (1965), de Jean-Luc Godard (n.1930).


Em "Encontros e desencontros", Charlotte (Scarlet Johansson) e Bob (Bill Murray),
um improvável casa, mostram que tem muio em comum

Um grupo de produtoras independentes se tornou dominante no circuito - entre elas a October Films, a Good Machine e a outrora poderosa Miramax. Porém, como muitos filmes voltados para o grande público também se beneficiaram do prestígio da cena, com o tempo o "espírito indie" se tornou mais um selo do que realmente uma nova experiência cinematográfica. Alguns dos principais estúdios criaram subsidiárias supostamente autônomas, como a Fox Searching Pictures, mirando captar algo do espírito indie sob seus domínios. Muitos cineastas adotam a abordagem "um para você, outro para mim", alternando entre um filme feito sob as ordens de estúdio e um temperado com as próprias idiossincrasias. Com os filmes da série "Hellboy" (2004-2008) e "O labirinto do fauno" (2006), o mexicano Guillermo del Toro (n.1964) foi capaz de explorar uma história em espanhol mais próxima do seu modo de ver o mundo, enquanto também produzia aventuras tiradas de histórias em quadrinhos, de natureza mais comercial. Rodríguez alternou-se entre "Pequenos espiões" (2001) e os mais experimentais "Sin City" (2005) e "Planeta terror" (2007). Da mesma forma, Soderbergh alternou entre uma produção assumidamente vistosa (a trilogia "Onze homens e um segredo, 2001-2007) e empreendimentos arriscados que beiravam a vanguarda ("Confissões de uma garota de programa", 2009). Gus van Sant também flertou com temas mais próximos do convencional ("Gênio indomável", 1997), antes de voltar a lidar com material mais abstrato em "Gerry" (2002) e "Elefante" (2003). Além disso, também não é raro que diretores independentes aceitem a lucrativa função de remendar roteiros em projetos de Hollywood, renovando as produções tradicionais com toques autorais mais pessoais: Taratino trabalhou em "Maré vermelha" (1995) e Sayles, em "Apollo 13" (1995).

Durante toda a sua carreira, o diretor-ator-roteirista Orson Welles (1915-1985) bateu de frente com os estúdios na disputa pelo controle, procurando uma forma de finalizar sua visão. A situação não é diferente na Hollywood de hoje e diretores bem-sucedidos como os irmão Coen insistem em dar a palvra final na edição de seus trabalhos, garantindo que seus filmes de destaquem das convenções de Hollywood. O desafio para os cineastas independentes americanos é oferecer aos espectadores alternativas genuínas aos temas e às práticas de produção hollywoodiana padrão. De fato, filmes independentes podem obter sucessos de bilheteria: "Pequena Miss Sunshine" (2006) e "Atividade Paranormal" (2007), filme de terror de orçamento baixíssimo, são exemplos recentes. Outro deles é "Catfish" (2010), que se tornou famoso à custa de uma polêmica em torno de sua suposta natureza documental. Desde a virada para o século XXI, a saúde do cinema independente americano se esvaiu de forma notável, mas, à medida que o custo dos equipamentos diminuem, o mercado da internet aumenta e a criatividade de Hollywood entra em estagnação, a ressurgência da produção independente não deve ser desconsiderada.

PRINCIPAIS ACONTECIMENTOS

1990 - O musical adolescente "Cry-Baby", dirigido por John Walters (n.1946), é lançado. Apresenta um grande elenco encabeçado por Johnny Depp.

1991 - O Festival de Cinema de Utah assume o nome de Festival de Cinema de Sundance: nasce uma marca.

1992 - Quentin Taratino faz "Cães de aluguel" e se torna um dos cineastras mais influentes da década.

1995 - "Dead man", de Jim Jarsmush, dá início ao gênero faroeste lisérgico.

1996 - Joel e Ethan Coen obtêm sucesso significativo com "Fargo", filme fundamental na carreira do ator Steve Buscemi, presença constante no cinema indie americano.

1998 - "Gênio Indomável" (1997), de Gus van Sant, ganh o Oscar de Melhor Roteiro para a dupla Matt Damon e Ben Affleck.

1998 - Chega aos cinemas "Felicidade", filme altamente polêmico de Todd Solondz sobre a solidão, a depressão e a pedofilia nos subúrbios americanos. 

1999 - Filmado em vídeo, "A bruxa de Blair" se torna o primeiro significativo a alcançar grande sucesso graças à divulgação via internet.

2003 - "Tiros em Columbine" ganha o Oscar de Melhor Documentário

2007 - "Pequena Miss Sunshine" (2006), de Valerie Faris (n.1958) e Jonathan Dayton (n.1957), ganha dois Oscars, entre eles o de Melhor Roteiro. 

3 comentários:

  1. a observar q são independentes mas meio do sistema...não tao radicais qto, por ex, anger.
    ah e vejam terence davies, um ingles, em filmes como distant voices.
    tentem achar.

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